Tribunais utilizam resolução para criar a polícia judicial

Uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) abriu espaço para o nascimento de um novo tipo de polícia no País: a Polícia Judicial. Essa polícia poderá, em casos de crimes ocorridos no interior de tribunais, instaurar “procedimentos preliminares apuratórios” e até mesmo realizar diligências.

Levantamento do Estadão mostra que o Tribunal Regional Federal da 2.ª Região (TRF-2), com sede no Rio, é o primeiro do Brasil a instalar sua polícia com base na resolução. Outros dois TRFs – o 4 (Sul) e o 5 (Nordeste) – estudam adotar o modelo, assim como seis Tribunais de Justiça: Sergipe, Rio Grande do Sul, Roraima, Maranhão, Acre e Distrito Federal.

A resolução 344 é de 2020. Elaborada na gestão do ministro Dias Toffoli, ela regulamenta “o exercício do poder de polícia administrativa no âmbito dos tribunais, dispondo sobre as atribuições funcionais dos agentes e inspetores da polícia judicial”.

Sob críticas, a publicação da resolução foi vista por especialistas como um risco à democracia e um “passo além”, após o Supremo Tribunal Federal ampliar suas atribuições para investigar crimes cometidos também os contra ministros, no chamado inquérito da fake news. Neste, porém, as diligências são feitas pela Polícia Federal, a pedido do relator, o ministro Alexandre de Moraes.

“É um passo além. Estão criando uma polícia própria para chamar de sua”, disse o professor Floriano de Azevedo Marques, diretor da Faculdade de Direito da USP. Com a resolução, nas apurações, as diligências poderão ser feitas pela Polícia Judicial, inspirada na Polícia Legislativa. O artigo 2.º diz: “caso sejam necessárias à instrução do procedimento apuratório preliminar (…) poderá a autoridade judicial determinar aos agentes e inspetores da polícia judicial a realização de diligências de caráter assecuratório que se entendam essenciais”.

No Rio, o TRF-2 informou que já tem Polícia Judicial criada nos moldes da resolução. Segundo o tribunal, há cerca de 230 agentes distribuídos pela sede do TRF-2 e pelas Seções Judiciárias do Rio e Espírito Santo. Antes de sua criação, em 2020, o poder de polícia administrativa era exercido por agentes de segurança judiciária. Esses técnicos eram servidores concursados e passaram a compor a Polícia Judicial. Por isso, conforme o tribunal, os gastos não aumentaram.

Um dos tribunais que estudam adotar a medida, o TJ-DF afirmou que possui 300 servidores com especialidade em segurança. “Atualmente, as funções de segurança institucional são exercidas com apoio de agentes e inspetores de segurança judiciária, os quais possuem competência para efetuar prisões, sejam em flagrante delito, sejam as determinadas por autoridade judicial, na esfera da competência jurisdicional da Casa.”

Segundo a desembargadora Ivana David, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), os magistrados sempre detiveram o chamado poder de polícia administrativa, que é a autoridade para manter a ordem nos tribunais. A presidência do TJ de São Paulo disse que não pensa em criar a Polícia Judicial. A segurança de desembargadores e das dependências da Corte é feita pela Polícia Militar.

‘Inconstitucional’

Nenhum tribunal consultado abriu até agora apuração com base na resolução. “Confunde-se o poder de polícia no âmbito da competência administrativa com o exercício concreto de polícia”, disse Azevedo Marques. Para ele, a resolução pode ser contestada. “Como as polícias têm assento constitucional, a norma é inconstitucional, pois cria polícia que não está prevista na Constituição.”

O delegado Henrique Hoffmann, professor da Escola da Magistratura do Paraná, também não vê previsão legal para a nova polícia. “O princípio da legalidade diz que a autoridade só pode fazer o que está expressamente autorizado em lei. Não adianta a resolução estabelecer algo sem previsão legal. O que está sendo aberto é mais uma possibilidade de investigação sem autorização da Constituição”, afirmou. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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