Novo pode perder maioria da bancada
“Todos já votaram no plenário? Eu ia perder ali o nosso deputado, futuro progressista, Marcel van Hattem”, disse Lira, indicando que o parlamentar gaúcho, um dos oito representantes do Novo na Câmara, deixará a legenda e voltará ao partido do qual saiu em 2018. Quando um deputado o alertou de que Van Hattem era “ex-progressista”, Lira não se fez de rogado: “Vai ser futuro. Ninguém se perde no caminho da volta”.
Diante da saia-justa, Van Hattem, que faz parte da ala que se opõe à posição do partido e de seu fundador e ex-candidato à Presidência, João Amoêdo, de apoiar o impeachment do presidente Jair Bolsonaro e atuar como oposição ao governo, apressou-se em negar a sua saída do Novo.
“Esse episódio foi uma brincadeira que o Arthur Lira tem feito comigo desde o início do mandato, em 2019”, disse ao Estadão. “Só que, desta vez, ele fez isso ao microfone e acabou gerando, sem querer, um grande mal-entendido. Nada além disso.”
Êxodo. Apesar do desmentido e de Van Hattem afirmar que o seu plano A “sempre foi e continua sendo” ficar no Novo, a possibilidade de ele deixar o partido, ao lado de quatro ou cinco colegas de bancada que rezam pela mesma cartilha, é real, e poderá se materializar na próxima “janela partidária”, em março, aprofundando o “racha” vivido pela agremiação.
Além de Van Hattem, poderão se desligar do Novo os deputados Alexis Fonteyne (SP), Lucas Gonzales (MG) e Gilson Marques (SC), todos candidatos à reeleição, e Paulo Ganime (RJ), líder do partido na Câmara, que pretende se candidatar ao governo do Rio em 2022. Em princípio, a deputada Adriana Ventura (SP), que também quer disputar a reeleição, deverá ficar, mas a sua saída não está descartada e dependerá de como a legenda vai lidar com os conflitos internos nos próximos meses.
Se o êxodo se confirmar, como tudo indica no momento, a bancada do Novo ficará reduzida aos deputados Tiago Mitraud (MG), que não deverá ser candidato à reeleição, Vinicius Poit (SP), já aprovado no processo seletivo do partido como pré-candidato ao governo paulista, ambos mais alinhados com a ala de Amoêdo, e talvez Adriana.
Convenções. Mais do que uma decisão voluntária, a migração dos parlamentares para outras siglas deverá ser a única alternativa para eles não ficarem sem legenda para participar do pleito no ano que vem. Embora os mandatários que queiram se candidatar à reeleição não precisem passar novamente pelo processo seletivo realizado pelo Novo, eles poderão ser vetados nas Convenções Estaduais, que dão o aval final às candidaturas, por não apoiarem o impeachment e defenderem a adoção de uma postura “independente” pelo partido. “Se o entendimento dos convencionais for de que a neutralidade é uma forma velada de apoio ao Bolsonaro, é possível que as candidaturas de quem não segue as diretrizes partidárias sejam vetadas”, diz Eduardo Ribeiro, presidente do Novo.
Já Paulo Ganime, que participa do processo seletivo que definirá o pré-candidato do Novo ao governo do Rio, poderá perder o lugar para Juliana Benício, candidata do Novo à Prefeitura de Niterói em 2020, estimulada a entrar na disputa com o deputado pelos próprios dirigentes do partido.
Como o resultado do processo seletivo deverá ser anunciado até o fim de setembro, Ganime ainda terá tempo de aproveitar a janela partidária para mudar de legenda se for preterido, embora afirme que poderá até deixar a política. Mas os parlamentares que pretendem concorrer à reeleição não terão a mesma oportunidade. Pelo calendário eleitoral, as Convenções só deverão ocorrer em julho, três ou quatro meses depois da janela partidária. Se eles ficarem no Novo até lá, perderão a chance de trocar de partido caso as suas candidaturas sejam rejeitadas.
Comissão de Ética. Há, ainda, o risco de os candidatos à reeleição ficarem sem legenda se forem punidos pela Comissão de Ética do Novo. O deputado Alexis Fonteyne, por exemplo, tem um processo contra ele correndo no órgão, por ter chamado Amoêdo de “calopsita” e poderá ser duramente penalizado por isso, a julgar pelas decisões tomadas recentemente em casos semelhantes.
Apesar de não haver prazo para a Comissão de Ética avaliar os processos pendentes, Fonteyne espera que a questão também seja definido em tempo de aproveitar a janela, se necessário. “Imagine a loucura se você não mudar de partido na janela, por acreditar que o Novo iria lhe dar legenda, e de repente, lá na frente, ele não lhe der”, afirma. “Aí, como é que fica? Você não poderá mais voltar atrás e mudar de partido.”
Se depender dos mandatários, eles preferem continuar no partido. A maioria entrou na política pelo Novo e se diz identificada com os valores e princípios da legenda. Pelo que dizem, será uma frustração ter de deixar o Novo por uma questão conjuntural, que consideram menor, e não por discordar das grandes bandeiras partidárias, como a liberalização da economia, a privatização e o combate ao mau uso do dinheiro público e à corrupção.
Diferença ideológica. Segundo Ganime, não há uma diferença ideológica muito grande entre as duas alas em que o Novo se dividiu. “O que está dividindo o partido não é uma visão do que se quer para o País. Todos os mandatários que conheço têm a mesma posição do partido, de não querer a eleição do Lula do Bolsonaro ou do Ciro Gomes e querer uma opção que pacifique o País e possa conduzir o governo de forma sensata, sem polarização, sem discursos absurdos e sem ódio”, diz. “O problema é que uma parte de filiados acha que quem não quer impeachment é bolsonarista ou é contra os valores do partido, mas ser a favor ou contra o impeachment não é o que define quem é do Novo.”
Ainda que possa parecer estranho para muita gente, a possível saída de deputados da legenda não parece preocupar nem a direção partidária nem Amoêdo. O fundador do partido afirma até que o “racha” é positivo. “Na minha avaliação, a saída de filiados que são contra o impeachment fortalece a unidade partidária, fundamental para o crescimento do partido”, afirmou Amoêdo, em publicação nas redes, ao comentar a desfiliação do cientista político Christian Lohbauer, um dos fundadores do Novo e ex-candidato a vice-presidente em sua chapa em 2018, anunciada na quinta-feira passada. “Nossa oposição ao governo e a defesa do impeachment vão continuar e nortear as nossas candidaturas em 2022”, diz Eduardo Ribeiro. “É compreensível que os mandatários que não concordem com essa posição queiram buscar outro partido.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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