Deputados querem abrir reservas florestais do Mato Grosso para mineração
O Projeto de Lei Complementar (PLC) nº 58/2020, de autoria do deputado estadual Carlos Avallone (PSDB), prevê que essas “áreas que propiciam a mineração possam ser exploradas de modo racional e sustentável”. Na prática, o projeto altera a finalidade da reserva legal. Ao permitir sua exploração, essa área poderia ser compensada, realocada ou até suprimida, embora a reserva obedeça a critérios e características para sua definição, sendo vedada sua supressão.
O Código Florestal federal (Lei 12.651/2012) estabelece que a reserva legal é uma área localizada dentro de uma propriedade ou posse rural que tem a “função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa”.
O porcentual da propriedade que deve ser registrado como Reserva Legal varia de acordo com o bioma e a região, sendo 80% de área preservada em propriedades rurais localizadas em floresta na Amazônia Legal; 35% em propriedades em áreas de Cerrado na Amazônia Legal; 20% na propriedade situada em área de floresta, outras formas de vegetação nativa nas demais regiões do país; e 20% na propriedade em área de campos gerais em qualquer região do país.
O projeto de lei estadual, além de ignorar a função básica atribuída por uma lei federal, também invade outra função federal, que é legislar sobre exploração minerária. Uma análise técnica aponta que há vício de iniciativa, uma vez que o artigo 22 da Constituição Federal estabelece que cabe privativamente à União legislar sobre “jazidas, minas, outros recursos minerais e metalurgia”.
“Ainda que a alteração e a supressão de áreas de proteção ambiental sejam permitidas por meio de leis, é vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção. Com isso, o PLC 58/2020 instaura uma clara descaracterização da Reserva Legal em contradição com o Código Florestal e a própria Constituição de 1988”, afirma o Observatório Socioambiental de Mato Grosso (Observa-MT), formado por organizações da sociedade civil com reconhecida expertise na implementação do Código Florestal.
O Ministério Público Estadual também questiona o projeto de lei. Em nota assinada pelo Procurador-geral de Justiça, José Antonio Borges Pereira, e pelo Procurador de Justiça de Defesa Ambiental e da Ordem Urbanística, Luiz Alberto Esteves Scaloppe, o MP diz que a proposta “fomenta a prática de ilícitos ambientais e resulta em novos estímulos aos desmatamentos no Estado de Mato Grosso”.
“O projeto pretende alterar o regime do instituto da Reserva Legal, descaracterizando-a e entregando ao comércio seu solo e, consequentemente, destruindo a flora e fauna ali presente, razão principal da sua existência”, diz o MP, por meio de nota. “Não precisaria dizer que a prática da extração de minérios, por si só já devasta o solo e o que está acima dele, além de que, em casos como este, se constituir em crime ambiental, de modo que a alteração legislativa proposta fomenta a prática de ilícitos ambientais e resulta em novos estímulos aos desmatamentos no Estado de Mato Grosso.”
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