Constituinte do Chile será 50% feminina e 10 povos indígenas serão representados

Os chilenos elegerão entre este sábado, 15, e domingo, 16, os 155 deputados constituintes que serão responsáveis por redigir a nova Constituição do país. A eleição ocorre sete meses após o histórico plebiscito que optou por uma nova Carta. Dezessete vagas são reservadas para povos indígenas. As mulheres serão metade dos eleitos, uma paridade inédita em uma Convenção Constitucional.

Para o historiador, antropólogo e professor da Universidade Católica do Chile, Rodrigo Mayorga, a paridade de gênero na redação de uma Constituição traz benefícios importantes. Um deles é garantir que aqueles que tomam as decisões representem de maneira adequada os que votaram por eles. O outro é a legitimidade. “Nada melhor do que uma mulher para discutir assuntos que são pertinentes a elas, que estão relacionados às experiências delas. Um exemplo é o aborto.”

Em razão da pandemia, a eleição, que já tinha sido adiada uma vez, ocorrerá em dois dias e o objetivo é que a população possa votar com tranquilidade e a segurança sanitária necessárias. Ao todo, são 1.374 candidatos divididos em listas, sendo algumas delas ligadas a partidos políticos, mas outras, não.

Candidata independente, Giovanna Grandón se tornou conhecida após participar dos protestos de 2019 e de 2020 vestida de Pikachu, personagem do anime Pokémon. No entanto, debaixo da fantasia, havia uma mulher disposta a mudar a realidade do seu país.

No ano passado, ela resolveu concorrer ao posto de constituinte pelo distrito 12, que reúne algumas das regiões mais pobres de Santiago. Caso seja eleita, Giovanna quer fazer uma gestão participativa. “Vou usar parte do meu salário como constituinte para criar uma plataforma em que as pessoas possam colocar suas principais demandas e, a partir disso, levarei os assuntos para serem debatidos em plenário.

Uma das bandeiras que ela pretende levantar, caso se torne constituinte, é a da educação inclusiva. De acordo com Giovanna, pessoas com deficiência têm dificuldades de serem inseridas em escolas regulares e, para que elas se desenvolvam, precisam parar de conviver apenas com seus semelhantes.

Sobre a igualdade de gênero na redação da Carta Magna, a candidata é incisiva. “A paridade foi uma conquista das marchas, principalmente a realizada em 8 de março de 2020, que reuniu milhares de pessoas. É preciso, de uma vez por todas, ter igualdade salarial neste país para pessoas que ocupam o mesmo cargo”, afirma.

Mãe de quatro filhos e avó de dois netos, até o início de 2020 Giovanna era motorista autônoma de van escolar. No entanto, acabou ficando sem trabalho em razão da pandemia. Foi então que se uniu a um grupo de voluntários para ajudar moradores de áreas pobres de Santiago.

Além dos constituintes, os chilenos também votarão por vereadores, prefeitos e governadores regionais. Os primeiros resultados serão divulgados na noite de amanhã e a expectativa é a de que aqueles que farão parte da Convenção Constitucional já sejam conhecidos no mesmo dia.

Os deputados constituintes chilenos terão nove meses para elaborar a nova Carta Magna – o prazo pode ser prorrogado por mais três meses. Finalizados os trabalhos, cerca de 60 dias depois, ocorrerá um novo plebiscito e, desta vez, os chilenos decidirão se aprovam ou não o novo texto. Caso ele seja aprovado, será o fim do último resquício da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990). Se for rejeitado, a atual Constituição, de 1980, seguirá vigente.

Dez povos indígenas terão direito a 17 cadeiras entre constituintes

Os povos originários do Chile também terão o seu lugar na Convenção Constitucional, que será eleita neste fim de semana. Serão 17 cadeiras reservadas para os 10 povos indígenas do país. Eles concorrerão por uma lista própria e apenas os indígenas inscritos no Serviço Eleitoral (Servel) ou que tenham algum documento que comprove que fazem parte de alguma etnia poderão votar. Os mapuches serão os mais representados, com sete assentos, seguidos pelos aimaras, com dois.

Mestre em antropologia pela Universidade de Brasília (UnB), Luis Campos vê a participação dos povos originários na redação da nova Carta Magna como algo muito positivo. “É necessário gerar um novo acordo no país que incorpore os indígenas com reconhecimento constitucional, como outros países já fizeram. E que eles possam participar em todas as decisões que competem a eles”, afirma o acadêmico chileno.

Segundo dados do último censo realizado no Chile, em 2017, cerca de 12% da população chilena é de origem indígena. Desses, 79,8 % se declaram mapuches. A etnia se distribui por várias regiões do Chile, mas está presente principalmente na zona central, onde está localizada a capital, Santiago.

Alihuen Antileo é um dos candidatos indígenas. Nascido em Temuco, no sul do país, se mudou para Santiago quando ainda era criança. Dentre as suas propostas para a nova Constituição está tornar o Chile um país plurinacional e plurilinguístico, que o ensino do mapudungun, a língua mapuche, seja obrigatório nas escolas públicas, e também que seja criado um banco de desenvolvimento indígena.

Além da lista indígena, os partidos conservadores, incluindo um de extrema direita, base de apoio do presidente chileno, Sebastián Piñera, figuram em uma lista única, enquanto as legendas de oposição de centro-esquerda se divide em vários blocos. No total, existem mais de uma centena de listas, incluindo muitas independentes.

Durante os debates, o setor que obtiver um terço dos 155 votos na Convenção Constitucional poderá vetar as propostas de seus adversários, que necessitariam de acordos transitórios para atingir os dois terços necessários para traduzir suas ideias em dispositivo constitucional.

Os votos começam a ser apurados amanhã. Primeiro, serão contados os votos dos constituintes, depois os dos povos indígenas, dos governadores, seguidos dos prefeitos e, por último, dos vereadores. O Chile costuma ter os resultados eleitorais poucas horas após o fechamento das urnas. No entanto, desta vez, os resultados devem demorar mais em razão do processo complexo que mistura sistema proporcional com voto distrital, além do ajuste entre candidatos homens e mulheres, que devem ter representação equivalente. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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