Comitê da ONU condena o uso de crianças fardadas em evento político de Bolsonaro

O Comitê da ONU dos Direitos da Criança (OHCHR) emitiu uma declaração nesta terça-feira, 5, em Genebra, em que condena a atitude do presidente Jair Bolsonaro de exibir uma criança vestida com farda da Polícia Militar mineira, empunhando uma arma de brinquedo, em evento na semana passada em Belo Horizonte.

A entidade afirmou, em nota, que “condena com veemência o uso de crianças pelo presidente Bolsonaro, vestidas com trajes militares e com o que parece ser uma arma de fogo, para promover sua agenda política”. “A circulação de imagens dessas crianças perpetua ainda mais o dano causado a elas e corre o risco de contribuir para a falsa percepção de que o uso de crianças em hostilidades é aceitável.” A informação foi revelada pelo jornalista Jamil Chade e confirmada pelo Estadão.

O episódio aconteceu na sexta-feira, 30, quando Bolsonaro participou de cerimônia de sanção de projeto para obras do metrô da capital mineira e do lançamento da pedra fundamental do Centro Nacional de Vacinas. Sentado ao lado do chefe do Executivo estava o menino de 6 anos.

Animado pelos gritos de “mito”, o presidente pegou a arma de brinquedo e o apontou para o alto. Em outro momento, cumprimentou os pais do menino pelo que chamou de exemplo de “civilidade, patriotismo e respeito”. Em outro momento, a criança ainda realizou flexões no palco do evento.

“Estou com quase 70 anos. Quando era moleque, brincava com arma, flecha e estilingue. Assim foi criada minha geração. E crescemos homens fortes, sadios e respeitadores. Meu cumprimento aos pais desse garoto, por tê-lo emprestado para dar um exemplo de civilidade, patriotismo e respeito. Obrigado, Polícia Militar de Minas Gerais”, disse.

No texto do comunicado, o comitê sugere que atitudes como essa devem ser criminalizadas. “A participação de crianças em hostilidades é explicitamente proibida pela Convenção sobre os Direitos da Criança (Artigo 38) e seu Protocolo Opcional sobre o envolvimento de crianças em conflitos armados (Artigos 1 e 4)”, cita. “Tais práticas devem ser proibidas e criminalizadas e aquelas que envolvem crianças em hostilidades devem ser investigadas, processadas e sancionadas”, completa.

A declaração não implica em imposição de sanção contra o Brasil, mas invoca que o país cesse “imediatamente e urgentemente o uso de crianças vestidas com uniformes militares para qualquer fim”, além de solicitar a retirada dessas imagens de todos os meios de comunicação e impedir sua posterior distribuição. O Comitê ainda complementa que, para não cometer, no futuro, práticas que violem os direitos da criança, o país deve divulgar amplamente informações sobre a Convenção sobre os Direitos da Criança e seus Protocolos Facultativos para profissionais relevantes e para o público em geral.

No último domingo, 3, cerca de 80 entidades ativistas, lideradas pelo Movimento Nacional de Direitos Humanos, apresentaram uma denúncia ao Comitê da ONU dos Direitos das Crianças e ao Conselho Tutelar de Venda Nova, em Belo Horizonte (MG), por causa da foto.

Segundo Mônica Alkimin, coordenadora do Movimento Nacional de Direitos Humanos, a declaração do Comitê atendeu à expectativa das entidades com a denúncia, que era um posicionamento institucional em relação à conduta reiterada do presidente Bolsonaro. “Se ele (presidente) persistir na conduta, aí sim vamos abrir uma denúncia no sistema de comunicação para que a conduta seja investigada”, afirmou.

“Você sabe atirar?”

Em 2018, quando ainda era candidato à Presidência, Bolsonaro tentou ensinar uma criança a fazer um gesto de “arma” com a mão em um ato de campanha. A um garoto que estava em seus braços com a farda infantil da Polícia Militar, o presidenciável disse: “Você sabe atirar? Você sabe dar tiro? Atira. Policial tem que atirar”.

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