Remando em outras águas…
A equipe estava composta por quatro remadores com a intenção de percorrer 220km em seis dias na Lagoa dos Patos-RS. Tudo estava meticulosamente planejado, como o percurso, o tempo, a alimentação, as paradas e os recursos necessários. Somente faltou combinar com o “imponderável” (Seu Antônio). Ao final do primeiro dia todo o planejado havia ido por água abaixo. O horário para finalizar a jornada deveria ser às 18h e já passavam das 22h sem concluir. A remada deveria ser desafiante sem ser dolorosa, porém agora estavam todos próximos da exaustão. Na escuridão da noite na lagoa o cansaço nos levava ao desespero. As águas internas se agitavam na ansiedade, no medo e no desassossego de cada um. Entretanto, um entre nós, que era técnico de remo olímpico, manteve o espírito elevado com a sua capacidade de extrair o melhor de cada atleta. As águas internas dos companheiros podiam estar agitadas, mas ele refletia a calma, o equilíbrio e a serenidade. Quando ele sentia que o clima ficava pesado com o silêncio reinando entre os integrantes da equipe, falava algo que nos animava. Num momento, ele disse:
– Falta menos. Amanhã serão outras águas!!!
Com isso, voltávamos a remar com a confiança de cumprir com a meta do dia.
Quem era o técnico de remo olímpico de que falo? Meu amigo Oguener Tissot que, lamentavelmente, foi remar em outras águas no acidente ocorrido no dia 20-10-24 na serra do Paraná. O que é o remo olímpico? É uma modalidade de velocidade que usa embarcações estreitas e leves em que cada atleta rema de costas. O atleta vê de onde veio, porém não sabe para onde está indo, analogamente à vida. No remo, realiza-se um movimento perfeito em que todos os grupamentos musculares do corpo são trabalhados simetricamente, sendo mais efetivo em águas calmas.
O meu amigo havia desenvolvido a capacidade de ensinar os seus alunos e atletas praticantes de remo, aclarando-os sobre as regras, os princípios e os valores da modalidade. Assim, ele sabia conduzir e preparar fisicamente cada um dos integrantes de sua escola, entre jovens, adultos e pessoas da terceira idade. Ele organizava, acompanhava e supervisionava todas as atividades propostas para os treinamentos, independentemente do objetivo. Para alguns o objetivo eram as competições, para outros o lazer e para outros mais podia ser o condicionamento físico. Sobretudo, o meu amigo ensinava os valores da lealdade, do respeito e da amizade, muito mais do que a busca por resultados num campeonato local, estadual, nacional ou internacional de remo. E considere-se que ele foi a pessoa que mais atletas competitivos promoveu na história recente do esporte no Brasil. Porém, o mais importante que ele fazia era resgatar o melhor de cada um a partir de dentro de si mesmo. As águas do rio, da lagoa ou do mar podiam estar agitadas, mas ele conseguia transmitir a calma, a serenidade e o equilíbrio a partir de sua força emocional. Ele havia se especializado em acalmar as águas emocionais de seus atletas e comandados.
Voltando ao nosso desafio de remar os 220km na Lagoa dos Patos, nós o cumprimos mudando o planejado em conformidade com a realidade, porque os planos e a realidade quase sempre se chocam. Ressalte-se que naquele momento de exaustão, cansaço e quase desespero relatado no início, o meu amigo era um atleta como todos nós. Por isso, certamente ele também estava cansado. Entretanto, ele conseguia encontrar forças para se manter calmo, sereno e equilibrado para incentivar aos demais como o técnico que foi. Porém, muito mais do que isso, ele era um amigo especializado na lealdade, no respeito, na confiança, na paz e na serenidade com que viveu a sua vida. Ele foi chamado para remar em outras águas onde vai, certamente, levar a calma, o equilíbrio e a serenidade que sempre promoveu na sua curta jornada aqui na terra.
Fique em Paz, meu Amigo, um dia nos veremos em outras águas!
Moacir Rauber
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In Memorian: Oguener Tissot