O cantinho da calma

Estava numa reunião pedagógica de professores de uma escola municipal que atende alunos do Ensino Fundamental, onde os professores compartilhavam as experiências nos diferentes momentos de interação com os alunos e entre si mesmos. Um professor comentou sobre um dos alunos de treze anos, que, por vezes, se punha agitado, nervoso e agressivo, descontrolando-se. Numa das ocasiões em que se descontrolou, o professor pediu para que o aluno fosse falar com a supervisora da escola. Nesse momento, a supervisora lembrou do caso e disse que o menino chegou na sala e teve que esperar, porque ela estava em outro atendimento. Na sequência, ela o recebeu sem saber a razão da presença dele:

– Bom dia, como você está? Do que se trata?

Foi uma saudação aberta, carinhosa e acolhedora que desarmou os últimos sinais de agitação, nervosismo e agressividade do menino. O que aconteceu durante o tempo que ele esteve na sala de espera? O menino, ainda que involuntariamente, fez uma pausa. Não se tratava do “cantinho do pensamento”, prática usada que pode representar a punição ou o castigo por algo feito, mas de um momento de tomada de consciência sobre o ocorrido. No período em que o menino esteve só na sala de espera ele teve tempo para se acalmar e repensar a situação, talvez descobrindo que as pessoas não estão umas contra as outras, mas umas para as outras, especialmente os professores. E nós, no nosso dia a dia, fazemos uma pausa? Provavelmente muitos de nós não conseguimos um tempo para uma pausa, seja ela no início da manhã para direcionar as atividades do dia ou durante o dia nas interações com outras pessoas. Sem a pausa, por vezes, as pessoas se tornam agressivas. O trânsito é um exemplo clássico onde as pessoas demonstram irritação frequentemente, colocando-se os motoristas uns contra os outros na disputa pelo espaço. Os motoristas se esquecem que estão nas ruas em direções diferentes, mas com o objetivo comum se deslocar de um lado a outro. Não deveriam estar uns contra os outros. Nas empresas ocorre um fenômeno parecido em que pessoas e departamentos se colocam em pé de guerra como se não estivessem na organização para cumprir com a mesma missão, apenas com atividades diferentes. Não há inimigos na organização. Nas cidades, nos países e na sociedade a lógica se repete porque não estamos uns contra os outros, seja entre Rio e São Paulo, entre Brasil e Argentina ou entre ateus e crentes ou qualquer outra classificação que pode representar uma divisão. Não temos inimigos naturais representados pelos predadores. Temos um único inimigo interno que não permite ver que o outro tem as mesmas necessidades e buscas que um mesmo, apenas com atividades diferentes e que escolhe outras estratégias para chegar aonde pretende chegar.

Como terminou a conversa com o aluno? Ao ser indagado pelo motivo da sua presença na sala da supervisora o aluno titubeou um pouco, porém, em seguida foi autêntico, exibindo humildade, coragem e confiança para dizer que se comportou inadequadamente. A autenticidade de reconhecer a inadequação do seu comportamento requer a humildade de quem tem a coragem para admitir a própria responsabilidade num momento de descontrole. Ficam as reflexões:  a situação não se desenvolveu como eu quis? O que fazer? Reclamar, maltratar ou agredir resolve? Provavelmente não. Fazer uma pausa pode ajudar a recuperar a consciência e a tranquilidade para atuar sobre aquilo que está no meu controle, porque o outro não é mais o meu predador nem o meu inimigo. Nas escolas, nas organizações, nas cidades e no mundo nós estamos com as pessoas, para as pessoas e pelas pessoas, porque sem elas nós não temos razão de existir. O meu inimigo não está do lado de fora, ele está dentro de mim e a pausa pode fazer com que o reconheça para me comportar de maneira a que eu não perca para mim mesmo.

O menino de treze anos encontrou um “cantinho da calma” para entender isso. E você, consegue?

Moacir Rauber

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