Pensar dói? Para inteligência artificial não…

Na primeira semana de aula, o professor teve uma agradável surpresa. Aquele aluno de quem ele havia construído a imagem de ser preguiçoso e de não se esforçar trouxe uma linda redação sobre as férias. Leu-a em público e disse:

Parabéns. Você está escrevendo melhor do que nunca!!!

Alguns murmúrios dos colegas, entre as palavras ouvidas estavam “ChatGPT” e “BARD”. O professor logo soube que se tratava de um texto redigido pela inteligência artificial. O que fazer? O trabalho de ser professor sempre foi um desafio e faz parte do desenvolvimento contestar, mudar e evoluir. As gerações acediam ao conhecimento prévio e desenvolviam algo a mais a partir dele. Entretanto, essa tendência começa a mudar ao se constatar que a atual geração deixa de ser mais inteligente que a anterior. Com o advento da revolução tecnológica, ancorada em outros fatores, ensina-se sobre visão sistêmica, porém não se vive e não se aprende como sendo parte do sistema. As gerações em que todos faziam parte do ciclo completo da alimentação, por exemplo, entendiam que caçar todos os animais de uma região faria com que tivessem que migrar dali; sujar a água de onde matavam a sede era um problema quase insolúvel; e que cultivar as plantas somente era possível em determinadas épocas do ano. Não se precisava ensinar sobre visão sistêmica, porque as pessoas se entendiam como parte dele. Com o passar dos séculos, os agrupamentos humanos cresceram e as tarefas começaram a ser divididas por especializações. Cada pessoa já não entendia o sistema inteiro, apenas a parte que lhe cabia no processo. A fragmentação das atividades deu início a fragmentação do indivíduo, que passa a ser muito bom em algo sem entender o seu impacto no todo. Desse modo, ao comer uma beterraba comprada no mercado não se sabe quem, como, quando e onde ela foi produzida. Ao comprar a carne não se tem ideia de que era uma vaca, criada, carneada e vendida por pessoas para alimentar pessoas. Ao abrir a torneira e tomar água não se sabe de qual manancial ela foi extraída. Nos desconectamos da natureza há algumas gerações, entretanto, seguimos desenvolvendo-nos como especialistas em alguma área. Por isso, ainda que ensinemos sobre a importância da visão sistêmica, caso não se viva isso não haverá aprendizado. Enquanto as gerações não aprenderem a limpar o próprio quarto, a lavar a própria louça, a plantar as próprias verduras e a tirar o leite consumido vamos continuar a lutar pela natureza com o celular na mão e as pantufas nos pés, usando apenas dois dedos dos dez disponíveis. Isso reflete igualmente que apenas usamos uns poucos neurônios dos bilhões que temos. Emburrecemos como indivíduos e, consequentemente, a tendência é trilhar o mesmo caminho como humanidade. Por fim, quando nos colocamos como “o homem e a natureza” parece óbvio que não saibamos o que comemos, o que bebemos e, por fim, o que pensamos. Nada mais simples do que usar a inteligência artificial para fazer a melhor redação do mundo. A lei do menor esforço, ou a preguiça, ganhou no sistema de produção de alimentos e agora começa a virar o jogo na arte de pensar.

Finalmente, o professor leu entusiasmado a redação para depois ficar frustrado com a revelação de que o seu aluno não era um gênio. Provavelmente, ele estava entre aqueles que seriam menos inteligentes que os da geração anterior por se achar esperto.  Terceirizamos e mecanizamos o ciclo alimentar para fazer menos esforço e sentir menos dor. Pensar, igualmente, pode ser cansativo e até doer, porém transferir a arte de pensar para a inteligência artificial requer cuidado. Desse modo, ao fazer a escolha de usar a inteligência artificial como uma ferramenta vinda do conhecimento exige sabedoria vindas do esforço, da dedicação e do trabalho. Com a Inteligência Artificial podemos afetar o mundo com a Imaginação e o Movimento, mas é preciso ter Afeto para fazer deste um mundo melhor.

Entende-se que pensar, por vezes, dói, entretanto, transferir a capacidade de pensar pode doer muito mais… Enquanto isso, vamos pular Carnaval!!! Para quê pensar?

Moacir Rauber

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