Onde você é “nós”?
Lembro do término de um contrato de trabalho por prazo determinado de seis meses de uma equipe inteira que havia alcançado excelentes resultados. Uma semana antes do término do contrato o diretor permanente comunicou a confirmação da dispensa. Porém, no comunicado ele dizia que essa era a notícia ruim, mas havia uma boa, porque algumas pessoas seguiriam na organização. As respostas dos membros da equipe temporária reforçaram a crença de que estamos num caminho evolutivo para aqueles que entendem o que é ser “nós” naquilo que se envolvem.
– Não se trata de notícia ruim… Disse um deles. Nós já sabíamos do final desde o início. Estou triste com a separação, claro, mas estou muito feliz por ter participado do projeto. Sorte a minha e daqueles que continuarão.
A esse e-mail se seguiram vários concordando e agradecendo por terem participado do projeto no qual se sentiram “nós”. Muitos trabalhadores “efetivos” não se sentem tão “nós” em muitas organizações.
Isso ficou evidente quando o gerente dos trabalhadores temporários, que era temporário, fazia a avaliação final com o diretor permanente da organização. Ele disse:
– Sim, nós concluímos todas as etapas, fizemos todas as tarefas a nós pedidas e entregamos um produto que está dentro dos melhores padrões de qualidade… Falou com tanto orgulho, incluindo-se na própria companhia.
O diretor permanente disse:
– É, vocês formavam um bom time. Sempre foram muito produtivos.
E concluiu:
Lembrando que vocês não fazem parte da empresa. Vocês são terceirizados. Uma coisa é bem diferente da outra.
O gerente temporário se ruborizou e a reunião foi encerrada.
Há uma tendência de que a gestão priorize cada vez mais os projetos com início meio e fim. Trata-se de um movimento em que a gestão mecanicista migra para um modelo de gestão flexível e autorregulada. Ainda que possa ser apontado como uma novidade e como evolução, não entendo assim. “Nós” sempre fomos e seremos parte de um projeto. Alguns mais importantes, outros menos. Alguns maiores, outros menores. Alguns mais extensos, outros mais curtos. Outros projetos podem ter regras mais rígidas enquanto outros mais flexíveis. A flexibilidade é uma tendência que se reflete em projetos mais curtos e menores, porém não menos importantes. E naqueles projetos importantes nós nos sentimos “nós”. E uma pessoa pode ser “nós” com carteira assinada ou sem. O que realmente importa é o quanto cada um se entrega ao projeto do qual participa. Espanta-me, porém, que muitos detentores de uma carteira assinada por prazo indeterminado não conseguem incluir na conjugação “nós” aqueles que trabalham na organização com contratos temporários. Miopia? Falta de compreensão que mesmo uma carteira assinada por prazo indeterminado pode acabar a qualquer hora? Quem disse que o diretor é permanente? No final, todos nós somos temporários…
Por isso, lamento a falta de entendimento demonstrado pelo diretor permanente da organização com relação aos trabalhadores temporários na interação com o gerente temporário. Quantas empresas investem milhões em formação e qualificação esperando que um dia os seus colaboradores permanentes assumam a organização como sua, referindo-se a ela como “nossa”? E aquele diretor permanente teve em mãos uma equipe temporária que vestiu a camisa da organização. Menosprezou o envolvimento e o comprometimento de seres humanos com o desenvolvimento de um produto de qualidade do qual a sua organização seria a primeira beneficiária. Não só não entendeu como se revelou arrogante e desrespeitoso, julgamentos derivados de quem não tem uma visão sistêmica da organização. Não teve o entendimento de que uma organização somente tem sucesso quando ela faz parte do “nós” de acionistas, diretores, gerentes, trabalhadores, consumidores e comunidade.
Dessa maneira, nos projetos organizacionais em que se participa pouco importa a opinião de colaboradores mais ou menos efetivos em função de uma carteira de trabalho. Cada “nós” nesse ambiente é determinado pelo envolvimento e comprometimento de cada um com aquilo que faz. Onde você é “nós”? Em qual projeto a sua entrega lhe permite referir-se a ele como “nós”? Em qual a organização você sente que pode referir-se a ela como “nossa”?
Moacir Rauber