Assiduidade na seleção brasileira aproxima jogador da Copa do Mundo do Catar

Com a equipe já classificada para a Copa do Mundo do Catar, a comissão técnica da seleção brasileira tem quase um ano para definir a lista dos 23 jogadores que tentarão mais uma vez conquistar o hexacampeonato. Em 2022, o Brasil completará exatamente 20 anos de sua última conquista mundial.

Num País em que brotam atletas, com os melhores indo para a Europa, mas também onde os que permanecem no futebol nacional são valorizados, a escolha é sempre difícil e não raramente causa polêmica. Segue critérios específicos, de desempenhos, métricas, mas também paixões, que ganham relevância e criam polêmica num país em que o povo tem entre suas maiores características opinar sobre o futebol.

Mas como se escolhe um grupo para disputar uma Copa? O Estadão mergulhou no assunto para entender essa questão, tendo como base o time atual de Tite e os outros formados neste século.

A espinha dorsal dos jogadores que vão representar o Brasil no Catar parece já estar formada, mas as frequentes mudanças de nomes nas convocações mostram que ainda pairam dúvidas na cabeça de Tite. Há incertezas nas laterais, no meio-campo e no ataque.

Uma análise das equipes que defenderam o Brasil neste milênio, de 2002 para cá, mostra alguns padrões comuns entre os treinadores. Para tentar entender como os técnicos montam a seleção brasileira para uma Copa, a reportagem analisou 103 escalações entre 2001 e 2018, além de outras 16 desde que o futebol foi retomado após a parada pela pandemia, em outubro de 2020.

Foram consideradas as partidas que aconteceram até dois anos antes de cada Mundial, na reta final de preparação. Ficaram fora jogos amistosos, partidas que serviram de homenagem ou duelos para os quais foram convocados apenas jogadores que atuam no Brasil.

Os números mostram que cada treinador utiliza em média 44 jogadores na metade final de cada ciclo para uma Copa. Com exceção dos goleiros, é raro alguém ser convocado para um Mundial se não tiver entrado pelo menos quatro vezes em campo no período.

O excesso de testes e concorrência, contudo, não quer dizer que disputar uma Copa se tornou um sonho mais distante para o jogador brasileiro. Para o antropólogo do Instituto Ludopédio Enrico Spaggiari, o que mudou foi a vitrine. “As formas de acesso se diversificaram com a expansão dos mercados e da circulação de atletas por cenários futebolísticos antes pouco observados no Brasil. Jogar nos mercados mais valorizados (dentro e fora do País) continua a ser a principal vitrine. Mas existem, cada vez mais, novos espaços de atuação que promovem oportunidades”, pondera.

Sobre isso, ele vê com bons olhos a busca por dezenas de jogadores na preparação. “Se para chegar à seleção é preciso jogar, ser visto e se destacar, então a profusão de cenários, e mercados, pode ser um facilitador para o grande contingente de jogadores atuando dentro e fora do Brasil”, diz Spaggiari.

Em 2018, quatro dos 20 atletas de linha da seleção que estiveram na Rússia atuaram menos de quatro vezes nos dois anos anteriores. Desses, dois eram laterais, Danilo e Fagner, sendo que um deles só foi convocado porque o titular, Daniel Alves, ficou fora por lesão.

Os outros dois foram Geromel e Fred. O zagueiro vivia boa fase no Grêmio e ocupou a quarta vaga para a posição e o volante entrou por ser considerado moderno, capaz de ajudar na marcação e encostar nos jogadores de frente.

Há três possibilidades para explicar a ausência deles nas relações anteriores: o treinador não levou fé em sua utilização ou se viu com jogadores tão bons quanto ou, ainda, teve de se render ao crescimento e à boa fase do convocado. A última opção é cada vez mais rara na seleção. Os técnicos têm se “fechado” com elencos.

Dunga foi outro comandante nacional que preferiu levar basicamente jogadores que já havia testado. Para a Copa da África do Sul, em 2010, Michel Bastos (3 jogos pelo Brasil), Gilberto (2) e Grafite (1) foram as surpresas. O trio foi levado mesmo com menos de quatro partidas pela seleção.

O treinador já havia testado 44 jogadores diferentes nas 25 partidas que antecederam sua lista final. Era um número alto, mas Dunga precisava testar. Ele nunca levou em consideração qualquer trabalho deixado pelos antecessores. Foi contratado pela CBF para acabar com o que chamava nos corredores da entidade de “farra da Copa de 2006”, quando o time se portou livre, leve e solto – e voltou para casa mais cedo.

Os testes incluíram os jogos que renderam ao Brasil o título da Copa das Confederações de 2009. A competição serviu para montar a base que foi para a África: 18 atletas que integraram aquele time voltaram para a campanha que se encerrou na derrota para a Holanda por 2 a 1, nas quartas de final.

A conclusão que se tira é que Dunga gostou do rendimento da seleção na Copa das Confederações e se convenceu de que o grupo poderia ser repetido na África do Sul.

DEPOIS DO TETRA – Técnico do tetra, Carlos Alberto Parreira foi o treinador que mais utilizou jogadores na seleção nas últimas duas décadas: 48 atletas diferentes entraram em campo nas 28 partidas disputadas sob o seu comando, entre 2004 e 2006, período final de preparação para o Mundial da Alemanha – e isso sem contar o jogo festivo que marcou a despedida de Romário.

Para reduzir a lista de 48 para 23 que foram à Copa de 2006, Parreira também optou pela experiência. O atacante Fred, utilizado apenas duas vezes no time, e o volante Mineiro, que não havia jogado ainda com Parreira e só entrou porque o escolhido para a posição, Edmilson, se machucou, foram as exceções. Ambos, porém, foram à Alemanha apenas para compor o elenco.

UM CASO À PARTE – Técnico do Brasil na última conquista e também no maior fracasso do time em Mundiais, Luiz Felipe Scolari foi um caso à parte. Tanto para a Copa do Mundo de 2002 (a do penta) quanto para a de 2014 (a do 7 a 1), ele assumiu a equipe apenas nos anos anteriores às disputas, tendo, portanto, menos jogos para testar os convocados.

Nas duas ocasiões, Felipão chegou para apagar incêndio. Isso não quer dizer que tenha sido ortodoxo. Ao contrário: utilizou nada menos do que 46 jogadores nas 13 partidas que teve entre o momento que assumiu e o dia em que divulgou a lista para o Mundial do Japão e da Coreia do Sul – e isso sem computar três amistosos em que só foram chamados atletas que atuavam no Brasil.

Ele arriscou tudo apostando na recuperação de Ronaldo, na boa fase de Rivaldo e contra uma pressão popular por Romário. Levou quem confiava. E fez um grupo coeso e redondo, a “família Scolari”.

Entre 2013 e 2014, ano da Copa do Mundo em terras brasileiras, Felipão teve 18 jogos até definir os escolhidos. No período, que incluiu um título de Copa das Confederações, foram 44 jogadores em campo.

CATAR – Desde que o futebol retornou após a parada provocada pela pandemia, Tite já utilizou 41 jogadores em 16 partidas – o jogo interrompido contra a Argentina não conta.

Antes de anunciar a lista com 23 jogadores que irão ao do Catar, o treinador deverá ter pelo menos mais oito partidas para testar atletas. São quatro pelas Eliminatórias (que podem virar cinco se a partida contra a Argentina for remarcada) e quatro em datas Fifa.

Essas partidas certamente ainda servirão para o técnico definir o grupo. É a chance para nomes que surgiram recentemente, como Raphinha e Antony, ou para quem sempre esteve no radar, mas quase não foi chamado por alguma circunstância, casos de Daniel Alves e Lucas Veríssimo.

Tempo ainda há, e o histórico das últimas Copas que mostra que atuar em pelo menos quatro partidas é ótimo começo. Jogador que se enquadra nesse critério, pode ser “pescado” por Tite na reta final.

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