Adesão ao ‘bolsonarismo radical’ cresce nas PMs
Há uma semana, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), afastou o coronel Aleksander Lacerda do comando no interior do Estado após o oficial chamá-lo de “cepa indiana” e ofender ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e outros políticos, além de convocar publicamente os amigos para os atos do Dia da Independência. Tudo por meio de sua conta no Facebook.
Para se ter uma ideia do tamanho do fenômeno detectado pela pesquisa, basta comparar os números envolvendo a PM com os da população em geral. Ao todo, 27% dos PMs do País interagiram em redes sociais em 2021, compartilhando, comentando ou curtindo publicações de páginas do que a pesquisa chama de “bolsonarismo radical”, que pertencem a grupos ou pessoas declaradamente fãs ou militantes do presidente – e que atuam “independentemente do jogo político ou das instituições”.
Na população em geral esse número ficou em 17%. “Não estamos falando de manifestações cívicas, mas da defesa da prisão de ministros do Supremo, do fechamento do Congresso e de outras pautas ilegais”, disse ao Estadão o sociólogo e diretor-presidente do Fórum, Renato Sérgio de Lima.
Os dados da pesquisa foram coletados com base em informações de profissionais das polícias no Portal da Transparência do governo federal e dos Estados. Depois, os pesquisadores selecionaram uma amostra desses profissionais que fosse representativa dos efetivos das corporações e analisaram 651 usuários no Facebook e Instagram com cargos em instituições policiais. O nível de confiança da pesquisa é de 95% e a margem de erro é de 3%.
O levantamento mostra também que a influência bolsonarista está concentrada nas corporações militares. É relativamente baixa a adesão aos ambientes de apoio ao presidente da República na Polícia Civil (13% em 2021 ante 9% em 2020) e na Polícia Federal – 17% neste ano em comparação aos 13% em 2020.
Por outro lado, a pesquisa constatou que 23% do oficialato da PM participou de ambientes radicalizados do bolsonarismo em 2021. Esse número era de 17% em 2020 – um crescimento de 35%. Outros 21% dos oficiais interagiram com páginas consideradas de “políticos de direita, que estão dentro da institucionalidade do jogo político partidário”. É o que a pesquisa descreve como “bolsonarismo orgânico”. Somando-se os dois tipos – extremados e orgânicos -, 44% dos oficiais da ativa interagiram com ambientes bolsonaristas.
Entre os praças – soldados a subtenentes – a presença em ambientes radicais do bolsonarismo saltou de 25% para 30% e, no chamado bolsonarismo orgânico, esse número passou de 16% para 21%, ante o registrado em 2020. Pelos dados atualizados, portanto, na base das corporações 51% dos praças demonstram apreço às teses bolsonaristas e 49% não interagem com o movimento.
‘Minoria barulhenta’
“Levando em consideração oficiais e praças, a maioria – 52% – não está interagindo. Mas a minoria barulhenta tenta cooptar o restante. Isso é reflexo do crescimento de 29% da presença de PMs nesses ambientes radicais. É preciso alertar para os riscos, pois há políticos que exploram sem pudor essa fissura que se abre em busca de palanque para reeleição”, afirmou Lima.
Para o diretor do Fórum, é preciso ter em conta que a interação de policiais militares com ambientes radicalizados do bolsonarismo se insere no contexto das manifestações do dia 7, nas quais parte do bolsonarismo quer defender o impeachment de ministros do Supremo, o fechamento do Congresso e a instalação de uma ditadura. Para tanto, esperam a presença maciça de militares da ativa e da reserva nos comícios que serão feitos pelo presidente São Paulo e em Brasília.
A exemplo do que foi mostrado pela pesquisa, a Polícia Militar de São Paulo está dividida. A bancada de deputados estaduais e federais eleita em 2018 busca convocar os policiais da reserva e da ativa para o ato na Avenida Paulista, em São Paulo. Mas o entendimento da maioria dos coronéis da corporação e do Ministério Público é de que a presença de policiais na manifestação de caráter político-partidário não é permitida pelo regulamento disciplinar.
Organizadores da manifestação creditaram a presença de PMs na Avenida Paulista – ainda que desarmados e sem farda – a uma espécie de repúdio ao afastamento do coronel Aleksander. O problema é que a decisão de afastar o coronel foi assinada pelo comandante-geral, coronel Fernando Alencar, o que agravaria ainda mais a transgressão disciplinar dos que se dirigirem à manifestação. Os que defendem a ida ao ato alegam que os PMs têm direito à liberdade de expressão garantida pela Constituição.
“Querem ter o bônus de ser militar e o de ser civil ao mesmo tempo”, disse Lima. Uma crítica destacada por ele e por outros especialistas ouvidos pela reportagem, os policiais que adotam teses bolsonaristas querem ser tratados como militares diante da Reforma da Previdência, mas desejam ser civis quando devem obedecer o disposto pelo regulamento disciplinar.
Na tarde de quarta-feira, o tenente-coronel da reserva Paulo Ribeiro, de 58 anos, que trabalhou na Corregedoria da PM, gravou um vídeo alertando aos policiais que a presença no ato pode configurar não só transgressão disciplinar, mas também crime militar. Ribeiro disse ao Estadão que a convocação de PMs da ativa para o dia 7 de Setembro “esbarra em dois pontos: o aspecto legal e a capacidade de entendimento dos nossos policiais militares”. Para ele, “o bolsonarismo na PM é um leão desdentado e sem garras”. “Faz muito barulho sem a menor possibilidade de causar danos.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Comentários estão fechados.